segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Detetives usam até softwares em busca de flagras


Infidelidade ainda é a maior demanda; investigação empresarial cresce.
Advogado fala sobre a complexidade da atividade quanto à privacidade.




A imagem do detetive particular que trabalhava apenas seguindo as pessoas, que ficava escondido em busca de um flagra, pertence ao passado. Hoje, a tecnologia foi incorporada à profissão, facilitando a rotina. São softwares para celulares, computadores e tabletes que captam conversas e fotos. Há ainda diferentes estilos de câmeras e gravadores escondidos. Tudo para descobrir o desvio da pessoa amada, do filho e também do funcionário. Apesar de a atividade não ser regulamentada no Brasil, não falta mão-de-obra. Os anúncios se multiplicam na internet e existem, inclusive, cursos de capacitação. No Paraná, são 111 cadastrados no Conselho dos Detetives do Brasil.

Há 29 anos no ramo, o detetive José Carlos Faria de Freitas, de 59 anos, se diz satisfeito com o que faz. “Têm coisas engraçadas, muita coisa. É uma coisa por dia, essa é a graça”. Freitas comenta que muitas pessoas têm vergonha de assumir que contrataram um investigador particular. Um exemplo, é o caso de um ato, de 74 anos, que prefere não se identificar. Ele contou ao G1 que havia vendido o carro para uma pessoa, mas não recebeu o dinheiro. “Eu não conseguia localizar a pessoa. Então, procurei uma agência. No contrato que a gente fez, ela tinha me passado o endereço errado”, lembrou o ator.

O serviço foi feito e, com o endereço certo em mãos, o ator foi atrás da pessoa que lhe devia. “Ela disse que estava viajando e que o celular estava sem crédito, que não podia fazer ou receber ligações. Conversa fiada, né?”
A verdade, porém, segundo o detetive Freitas, é que o ator havia se envolvido com uma garota de programa, se apaixonado e acabou caindo em uma espécie golpe. "Ele deu o carro para ela e quando ela sumiu, ele foi atrás. Quando ele cobrou o carro, ela falou que pagaria em programas", disse o detetive. Freitas afirmou que esse comportamento é comum, inclusive, no momento em que o cliente procura o investigador. Ele comentou que, em alguns casos, os clientes passam as informações mais precisas aos poucos, quando o contato entre investigador e cliente começa a ficar mais próximo.
Independente da vergonha e do receio dos clientes, o serviço precisa ser entregue. Para isso, a tecnologia se tornou uma aliada, alterando a forma de trabalho para melhor. Apesar das renovações, situação mais comum nos escritórios não mudou. Diante da suspeita, marido ou esposa querem descobrir ou descartar a infidelidade conjugal.

Freitas comenta que 90% dos clientes que o procuram confirmam a traição do parceiro. “Ela ou ele tem já tem certeza, mas não tem a prova. Ele vem aqui só para ter a prova”, disse. Nesses casos, é comum que a pessoa peça para que o detetive siga o companheiro, entretanto, adepto à tecnologia Freitas recomenda um software de fabricação israelense.

 “A pessoa, por exemplo, diz que está indo para um lugar. Você vai saber em que rua ela está, em que número. A pessoa entra no Facebook para conversar com alguém, você vai receber o link para acessar o que ela estava vendo. Em alguns casos, a pessoa combina um encontro com a amante no "mesmo lugar de sempre", mas a esposa ou o marido não sabe qual é esse local. Nessa situação, então, é feita a campana. “Só para registrar, para confirmar”, esclarece o detetive.


De acordo com Freitas, a diária para vigiar alguém pode custar de R$ 450 a R$ 600. Com o passar do tempo, a espionagem em família ganhou um novo foco. Agora, segundo Freitas, é comum também os pais procurarem o detetive para descobrir se o filho faz uso de drogas. “Eu tive o caso de um cliente que contratou dez dias para seguir o filho. Nesses dias, não aconteceu nada. Depois ele foi descobrir que o garoto estava em semana de provas, batalhando, estudando. Não fez nada de errado. Então, ele comprou um celular bonito e nós colocamos o software. De um dia para o outro, ele pegou. O rapaz começou a passar códigos de uso de drogas”, lembrou.
Freitas afirma que essa preocupação dos pais começou a chegar ao escritório, com mais intensidade, nos últimos dez anos. Segundo ele, justamente pelos preços cobrados, são famílias com poder aquisitivo razoável, são adolescentes e universitários. “O pai chega angustiado, está querendo saber alguma coisa, tentando alguma coisa para poder ajudar, tirar o filho daquilo. É complicado”.

Espionagem no ambiente de trabalho
Cresce também os casos de espionagem empresarial. Em muitos casos, o empregador desconfia de um sócio, de algum trabalhador que pode estar envolvido, por exemplo, em desvio de carga, roubos de equipamentos ou ainda recebimento de propina de fornecedores.
Aqui, o detetive costuma agir infiltrado e é de fato contratado pela empresa com salário, carteira assinada e responsabilidade como qualquer outro empregado. A ideia é que ninguém desconfie dele. Nos casos em que a empresa realiza uma seleção adminissional dividia em etapas e dinâmicas, a empresa já sabe quem é o detetive e o aprova na seleção.

Uma vez dentro da empresa, o detetive procura se aproximar do funcionário que pode estar envolvido em algum esquema. O objetivo é estreitar a relação, a ponto que ele seja convidado a participar da irregularidade e entender todo o processo. Feito isso, a empresa tem o que precisa para acabar com os desvios e, normalmente, demitir o funcionário por justa causa. De acordo com Freitas, o detetive vai munido de toda a tecnologia. São celulares que enviam automaticamente para o sistema do escritório, escutas telefônicas e fotos. O monitoramento acontece em tempo real para evitar que qualquer informação seja perdida.

A investigação empresarial se tornou a paixão do detetive particular José Devanir, de 52 anos, que tem escritório no norte do Paraná. A rotina de trabalho dele mostra o quanto esta área cresceu, especialmente, segundo ele, nos últimos dez anos.
Tem uma multinacional que eu presto serviço há dez anos (...) A área de investigação privada tem muito campo. Eu me especializei nisso que é o meu forte. Eu tiro de letra, qualquer investigação. Você precisa ser bom naquilo que você faz. É o que eu mais gosto”, disse.
Para ele, o início da investigação empresarial foi sofrido, mas com a tecnologia as tarefas ficaram mais fáceis de executar. Além disso, o detetive ganhou mais tempo, já que casos são solucionados mais rapidamente.
O detetive tem um técnico próprio para aprimorar e desenvolver equipamentos de espionagem. “O meu relatório é um CD com tudo filmado, fotografado, com data e hora. São provas”, destacou.
Siqueira comentou que um dos casos mais comuns é fraude ao INSS. As empresas contratam o detetive particular para verificar se aquele funcionário, que está afastado das funções, realmente não tem condições para trabalhar. “Ela fica encostado por um mês e vai conseguindo, fica mais um mês e tem caso em que fica dois três anos encostado. Mas, em 80% dos casos, a pessoa está trabalhando em outro lugar e a empresa é lesada. O INSS também que fica pagando”, disse Siqueira.
Se as empresas já descobriram e adotaram a investigação particular, também há funcionários que usam as técnicas para produzir provas contra patrões que infringem a lei ou desrespeitam os profissionais. Siqueira mencionou que já atendeu casos de mulheres que o procuraram porque o chefe as assediavam. “Houve um caso de uma mulher casada que me procurou porque o patrão fazia o horror. Dizia que se ela não saísse com ele, iria falar para o marido dela que ela estavam 'dando em cima' dele”. Nesses casos, Siqueira instrui a funcionária a implanta equipamentos no ambiente de trabalho para produzir provas. Com uma década dedicada a investigação empresarial, o detetive avalia que especificamente esses casos estão se tornando mais raros. Afinal, como brincou o detetive, os chefes estão mais consciente e espertos de que hoje é mais fácil produzir provas.

“Eu estou meio cansado. Às vezes a gente está com cinco, seis investigações ao mesmo tempo no escritório, mas eu adoro do que eu faço. É a minha vida. Às vezes eu falo que vou parar, mas vou para o meu sítio, descanso e continuo. É um trabalho gostoso, uma adrenalina. Cada caso é um caso, e tem alguns de cair o cabelo”.

Os preços da investigação empresarial variam. Tem alguns casos, que Siqueira fecha pacotes com as empresas contratantes. Já os casos conjugais, o detetive não faz por menos de R$ 5.000,00.

O que diz a lei
Ainda que não seja regulamentada, a atividade de detetive particular não é, necessariamente, ilegal. O complicador está na forma como as informações e dados são obtidos. De acordo com a advogada e presidente da Comissão de Advocacia Criminal da seccional paranaense da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PR), Priscila Placha Sá, algumas funções da profissão são delicadas por fazer uso de algumas técnicas e ferramentas que beiram a ilicitude. “Ela pode ser legal quando não violar a privacidade”.

“É complicado. Os contornos da atividade são bastante delicados. A possibilidade de violação da privacidade é bastante restrita segundo a Constituição”, disse a advogada. Ela complementa ao mencionar que a legislação brasileira fala que a violação da privacidade só é permitida por meio da quebra do sigilo telefônico, após autorização judicial. Isso quando forem esgotados outros mecanismos de comprovação probatória. Entretando, já existem jurisprudência que caracterizam outras formas de obter informações como violação da privacidade.

Se existe esta exigência em relação ao Ministério Público e a polícia, acrescentou a advogada, imagine a complexidade quando se fala em um ente particular.
“Não é porque eu caso com alguém que essa pessoa pode devastar a minha privacidade”, exemplificou. Priscila Sá disse ainda que se o marido ou a esposa violar a correspondência do companheiro estará cometendo um crime.

O mesmo entendimento é válido para as demandas de investigações empresariais. No caso de pais que procuram informações sobre o filho adolescente é possível alguma relativização sob o argumento da proteção, contudo, lembrou a advogada, é sempre delicado.

Priscila Sá afirmou que, em caso de desrespeito à lei, tanto quem presta o serviço quanto quem  o contrata estão sujeitos a responder pelos atos criminalmente. Ela ressaltou que é preciso ter cuidado com o que será feito com o material colhido pelos detetives. “Não pode fazer chantagem ou qualquer espécie de ameaça”, pontou .



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